E se a gente te falasse que a ciência e a política precisam conversar melhor?
Escrito por Wendell Mascarenhas Freitas
Quando pensamos em políticas públicas baseadas em evidências, imaginamos a ciência direcionando a política para chegar a um resultado desejado. Mas, na prática, há o risco do uso de dados e evidências como ferramentas políticas para defender valores e crenças que não são baseados na ciência.
Um exemplo são as políticas educacionais baseadas em evidências. No Brasil, são aplicadas avaliações de ensino que buscam entender os níveis de aprendizagem dos estudantes do país e coletar dados, como o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE).
Mesmo com muitos dados sendo coletados e analisados, muitas vezes dirigentes públicos podem usar apenas um recorte artificial dos dados para dar suporte a decisões baseadas em crenças pessoais. Dessa forma, apesar de parecer que a decisão foi tomada com base em dados e evidências, na realidade o processo político sobrepôs o científico.
Mas o contrário também pode acontecer: imagine uma decisão baseada completamente na ciência, mas que não corresponde às expectativas sociais e políticas sobre o governo. Mesmo que a decisão seja cientificamente embasada, sua baixa legitimidade perante os atores políticos e sociais pode diminuir sua efetividade e até mesmo sabotar a sua implementação.
Quando falamos em políticas públicas informadas por evidências, estamos falando da tomada de decisão que dialoga com a política e a ciência. Nesse diálogo, as evidências continuam importantes e devem participar do processo de tomada de decisão, mas também consideramos que é impossível deixar de lado valores políticos que afetam o processo de decisão, como posicionamentos, crenças e formas de ver o mundo.
Para que pesquisadores e gestores sejam parceiros, deve-se entender que o processo de decisão não é algo linear e perfeitamente racional e que a troca é fundamental. É importante que cresça nas políticas públicas uma cultura de valorização da pesquisa. Ao mesmo tempo, uma cultura de tomada de decisão deve ajudar os pesquisadores a entender como a ciência pode ajudar no processo político, assim, ambas as áreas podem trabalhar juntas.
A ciência está sempre em evolução e mudança, com o constante surgimento de novos conhecimentos, enquanto a tomada de decisão política é marcada por muitas restrições e incertezas. Por isso, nenhuma das duas será perfeita e imutável, por isso, para alcançar um melhor resultado no processo de decisão, a ciência e a política devem se unir. De um lado, a ciência informando a política e de outro lado a política humanizando o debate, trazendo aspectos morais, éticos e, no geral, humanos, em um processo que deve se considerar dados, mas também as pessoas. Para isso, precisamos de cientistas na gestão e de gestores na ciência, permitindo assim pensar e criar políticas públicas informadas por evidências.
Quer saber mais? Dá uma olhada nesses documentos:
The Knowledge Translation Toolkit.
The politics of evidence: from evidence-based policy to the good governance of evidence.
Também recomendamos conhecer um pouco melhor os vieses cognitivos que influenciam muito a nossa tomada de decisão: